domingo, 1 de julho de 2012



Iolandas e Copolas.

Quando eu era guria, adorava novela, mas aos poucos fui abandonando o vício e hoje assisto apenas a uma ou outra, sem fissura. Mas esse capítulos finais de “A Favorita” estão me deixando presa em frente à tevê, seja pelo desempenho magnético de Patrícia Pillar, seja pelas situações bizarras que sempre acontecem quando o final de uma novela se aproxima. Vira o samba do crioulo doido. E, por isso mesmo, fica mais divertido.
Mas não sobre os absurdos da trama central que quero falar, e sim sobre um núcleo bem menos ruidoso e mais realista. É o que envolve o casal Copola e Iolanda, vividos pelos excelentes Tarcísio Meira e Suzana Faini. São dois coadjuvantes de luxo que não têm o que fazer em cena, a não ser demonstrar, com muita sutileza, a importância da sintonia para a felicidade de um casal.
Copola, apesar do jeito rústico, é um homem que gosta de livros, que se emociona com música, que sabe apreciar arquitetura histórica, que dá o devido valor à arte. O resultado disso é que se tornou um homem com uma sensibilidade refinada e um olhar abrangente para a vida. Se sente confortável em qualquer ambiente porque sabe que o dinheiro não torna ninguém melhor do que os outros: ele é um cidadão que mergulhou no mundo sem sair da sua aldeia, portanto transita em qualquer meio com a segurança de quem fez das emoções o seu código de conduta.
Sua mulher, ao contrário, não compreende onde está o mérito de se entregar à contemplação do que lhe parece tão abstrato. Ela dedica sua vida à cozinha e à limpeza da casa. Só lhe interessa o que é prático. Não se desloca um milímetro do lugar comum, é a embaixatriz do trivial. Dá a impressão de que a rotina escravizante é que lhe deixou assim amarga, mas essa escravidão não foi imposta pelas paredes do seu castelinho de alvenaria: ela se deixou enclausurar pela ignorância. Tornou-se obtusa por não desenvolver a paixão pela vida e perdeu ambas: a vida e sua paixão.
Às vezes as pessoas me perguntam: por que os casamentos terminam tão cedo hoje em dia? Não terminam mais cedo hoje. É que antes o casal não se separava porque a mulher não tinha como se sustentar, e isso dava a falsa impressão de que eram casais longevos. O casamento acabava, mas o convívio prosseguia. Mais do que a separação de corpos, o que pode dar fim a um amor é o distanciamento de percepções: um enxerga o mundo em cores, o outro em preto-e-branco. Um percebe a delicadeza e a profundidade de tudo o que existe, o outro não consegue ir além da superfície. Pode um casal ser mais desunido do que aquele que, olhando na mesma direção, não consegue enxergar a mesma coisa?
Temperamentos antagônicos apimentam uma relação, dão graça ao embate, mas a falta absoluta de afinidades emocionais e intelectuais torna a convivência desértica e sem comunicação. Sentir o mundo de forma parecida é o que formata uma dupla. Copola e Iolanda não se traem, não se espancam, não brigam nem reatam mil vezes, não é o protótipo do casal de novela e não faz a mínima diferença se ficarão juntos no final. Nunca estiveram.




Martha Medeiros

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